O objetivo deste estudo é investigar alguns índices populacionais e o perfil dos servidores públicos municipais de 8 cidades mineiras. Estas cidades são as mesmas estudadas no artigo anterior: Juiz de Fora, Cataguases, Barbacena, Betim, Contagem, Belo Horizonte, Uberaba e Uberlândia.
Existe alguma relação entre os índices populacionais e o perfil trabalhista dos servidores? Essa foi a questão que motivou essa análise.
Índice
Conceitos
Para fins de compreensão da análise, é interessante definir os diversos tipos de contratação da administração pública.
Funcionário comissionado: Funcionário que tem como vínculo apenas o cargo comissionado que exerce;
Funcionário/servidor estatutário: funcionário contratado sob o regime jurídico único – RJU, que rege a contratação no serviço público;
Funcionário regido pela CLT: Funcionário contratado pela prefeitura sob o regime da Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT;
Funcionário sem vínculo permanente: Funcionário que trabalha por prestação de serviços, sem vínculo empregatício e sem carteira de trabalho assinada. Também são incluídos nesta categoria os autônomos, estagiários, voluntários e aqueles cedidos por outras administrações
Atlas do Estado Brasileiro
Para cada tipo de contratação há uma justificativa própria, sendo que o funcionário sem vínculo permanente é aquele contratado em caráter emergencial, conforme a Constituição de 1988:
Art. 37, IX, Além dos servidores públicos concursados ou nomeados em comissão, a Constituição Federal permite que a União, os Estados, e os Municípios editem leis que estabeleçam os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público
Constituição Federal de 1988
Vantagens e desvantagens das contratações temporárias
Belo Horizonte é a cidade que mais se destaca neste despretensioso estudo, apresentando índices muito melhores do que as demais cidades. No entanto, quando se observa a distribuição dos tipos de vínculos empregatícios, ela apresenta considerável número de pessoas sem vínculo permanente.
O processo de troca de poderes a cada 4 anos é inerente à democracia e o equilíbrio entre as forças internas e externas dos entes federativos competem entre si, e às vezes se enfrentam. Isso não é diferente na esfera municipal, pois a fragilidade gerencial aumenta quando a maioria dos cargos de diretores e gerentes ficam nas mãos de comissionados, que não são obrigados a terem conhecimento de gerência administrativa e por vezes, nem são cobrados por isso.
De igual modo, prefeitos e secretários também não precisam assumir papel de gestores, nem ter o mínimo de conhecimento para assumir uma estrutura organizacional “empresarial” de médio a grande porte por apenas alguns anos.
Todas as cidades utilizam a prerrogativa de empregar pessoas que não fizeram concurso público. Este é um assunto extensamente discutido ao longo de décadas, perpassando pela problemática da corrupção de servidores e do tamanho da “máquina pública”, entre outros assuntos polêmicos (Rezende, 2017).
Servidores sem vínculo empregatício têm sido contratados por problemas relacionadas à falta de servidores para determinadas áreas, como, por exemplo, professores. Contratação de agentes endêmicos e recenseadores são outros exemplos de contratações temporárias. Ao contrário dos cargos comissionados, não são necessariamente preenchidos por indicações de prefeitos e secretários, quando se inicia um novo mandato.
Os direitos trabalhistas desses servidores sem vínculo diferem dos funcionários de carreira, dependendo da legislação, podem não ter direito às férias, 13.º salário, entre outros previstos na lei trabalhista.
Já o funcionário comissionado nomeado por indicação política sofre da inerente instabilidade, delimitada pelo pouco tempo de efetiva contribuição para a gestão pública. Esse é um dos riscos relacionados a cargos indicados. Esses cargos também estão mais sujeitos a transferências de setor dentro da própria estrutura organizacional e a curva de conhecimento do servidor acaba por interferir na sua produtividade e na dos demais com quem trabalha.
Uma das grandes vantagens do funcionário de carreira se dá através do conhecimento adquirido ao longo do tempo, que solidifica a estrutura governamental. Quando bem direcionados, funcionários são âncoras seguras na implantação das diversas políticas públicas de cada governo que assume a estrutura pública.
É imprescindível afirmar, no entanto, que, sem a mistura de pessoas exógenas ao setor público, o risco de isolamento em uma burocracia estanque é real.
No quadro geral a seguir, pode-se constatar que a maioria dos funcionários da administração pública direta ainda são estatutários, cargos efetivos.
No que se refere à administração indireta, o quadro geral de todas as cidades muda de figura com a maioria dos funcionários celetistas, seguido de estatutários. Vale a pena conferir clicando no gráfico do número de habitantes por cidade, pois cada uma apresenta sua própria característica.
Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)
O IDH é uma medida para avaliar o desenvolvimento humano em contraponto ao Produto Interno Bruto (PIB) per capita. Atualmente, os três pilares que constituem o IDH (saúde, educação e renda) são mensurados dessa forma:
- Longevidade saudável, medida pela expectativa de vida e saúde;
- Acesso ao conhecimento formal a partir de 25 anos;
- Expectativa de anos de escolaridade das crianças a partir do início da vida escolar e
- Padrão de renda medido pela Renda Nacional Bruta (RNB) per capita, expressa em Poder de Paridade de Compra (PPC) constante, em dólar, tendo 2005 como ano de referência.
Se deseja saber mais, consulte aqui.
Embora haja discrepâncias acentuadas entre as 8 cidades consultadas (de 0,749 a 0,81), todas possuem IDH alto, conforme escala publicada pela Wikipedia, .
Visualização
População empregada x servidores públicos
Pode-se ver quatro grupos distintos no segundo gráfico do meio do painel. Ele destaca o tamanho da população em relação à porcentagem de servidores públicos. As cores das barras se referem ao tamanho da população. As duas cidades com menor população possuem maior percentagem de servidores públicos do que cidades maiores, mas não aparece a correlação inversa quando se observa as cidades com maior população.
Um caso sugestivo pode ser visto na cidade de Uberlândia: ainda que a proporção de servidores públicos e população seja a mais baixa entre todas as cidades, apresenta alta taxa de pessoas ocupadas, média salarial acima da média geral e apresenta quase 90% de servidores estatutários. É a segunda classificada em número de servidores efetivos, tanto na administração direta quanto na indireta. O seu IDH e a percentagem da população empregada estão atrás somente de Belo Horizonte, se aproximando dos índices das capitais.
Conforme relatado no ensaio sobre a riqueza das capitais brasileiras, a média de servidores por população das capitais mais ricas e com melhor IDH é de 2,15%. Diferentemente do estudo das capitais, as 8 cidades selecionadas neste ensaio demonstram que não há relação entre maior percentagem de funcionários públicos com melhor qualidade de vida para o cidadão no que se refere ao IDH.
Estado x Governo
Esse é uma discussão importante para a gestão de Estado, que é diferente da gestão de governo. O primeiro se refere à políticas públicas de longo prazo, independentes da direção política. Entretanto, exceto nos casos de grandes áreas, como a educação e a saúde, de onde informações coletadas nos municípios servem para definir os quantitativos de verbas federais ou estaduais, não há como saber o “tamanho do Estado” ideal pela percentagem dos servidores públicos em relação à população. Há necessidade de avaliações e análise dos dados para entender como as políticas públicas municipais impactam sobre a população e dessa forma, o Estado pode crescer ou diminuir de forma eficiente.
Ao que aponta esse breve ensaio, cidades mais estruturadas com maior contingente populacional parecem exigir maiores esforços dos poderes municipais para se organizarem de forma a prestar melhores serviços. Um estudo mais amplo poderia mostrar mais relações entre os dados analisados aqui.